quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Bases conceituais: Ortografia



Universidade Federal do Rio de Janeiro
Centro de Filosofia e Ciências Humanas
Faculdade de Educação
Curso de Pedagogia
Disciplina Didática da Língua Portuguesa – EDD361
Professor Doutor Marcelo Macedo Corrêa e Castro
Bases conceituais: Ortografia



Períodos históricos: Fonético, pseudoetimológico e simplificado

MORAIS, Artur Gomes. A norma ortográfica do português: o que é? para que serve? como está organizada? IN: MELO, Kátia Leal Reis de; MORAIS, Artur Gomes de e SILVA, Alexsandro da. Ortografia na sala de aula. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. Disponível em <http://www.ufpe.br/ceel/e-books/Ortografia_Livro.pdf> Acesso em 2/12/2013.

Com base em dados como esses e da nossa experiência em diversas escolas públicas e privadas, entendemos que pouco mudou na forma como a ortografia vem sendo tratada na escola. Se fora da instituição escolar ela é cobrada – e seu não-cumprimento é fonte de discriminação e exclusão –, cremos que também nas salas de aula a ortografia ainda é vista como tema de cobrança, verificação, avaliação e... punição. A partir da década de 1980, observamos também, aqui e ali, um fenômeno preocupante: em nome do que julgamos uma má interpretação do construtivismo, vários educadores passaram a considerar que não deveriam ensinar ortografia, que os alunos a aprenderiam “naturalmente”, etc. Mas, no final de contas, continuaram cobrando dos aprendizes o que deixaram de ensinar (p.12).
Diferentemente de outras línguas, como o francês e o espanhol, que já tinham normas ortográficas no século XVIII, no caso do português demoramos muito em fixar uma convenção ortográfica a ser adotada por todos os usuários do idioma. Na realidade, até hoje existem algumas pequenas diferenças no modo como se notam certas palavras no Brasil e nos demais países em que o português é língua oficial (escrevemos ator e em Portugal escreve-se actor, por exemplo) (p. 13).
Por um lado, desde a Roma e a Grécia antigas, já existia tendência de buscar respeitar o princípio fonográfico, segundo o qual a ortografia deveria estar o mais próxima possível da pronúncia das palavras (p.14_.
Por outro lado, encontramos há muitos séculos a defesa de um princípio etimológico, segundo o qual as palavras provenientes de outra língua deveriam preservar as grafias que tinham nas línguas de origem (Idem).
Finalmente, nessa disputa entre perspectivas diferentes, a história de evolução das normas ortográficas das línguas aqui mencionadas revela que não só tendeu-se a fazer um “casamento” dos dois princípios (fonográfico e etimológico) já citados, como a incorporar formas escritas que surgiram por mera tradição de uso (Ibidem).
Por ser uma convenção que contém não só regras como irregularidades, muitas pessoas imaginam que a ortografia é um acidente histórico desnecessário, que apenas serve para dificultar a tarefa de quem escreve. Sonhando com o cumprimento à risca de certo ideal atribuído ao alfabeto, segundo o qual cada som deveria ser notado por uma única letra, imaginam que seria possível abrir mão da norma ortográfica (P.15).
Como mencionamos há pouco, as palavras de uma língua não têm – não tiveram, nem nunca terão – pronúncia única (Idem).
Do ponto de vista teórico, algo numa língua só constitui um fonema se, em oposição a outro fonema, produz mudanças de significado [...] É necessário, portanto, reconhecer que a notação alfabética traduz para o papel coisas que, por essência, não têm sempre “um jeito único de ser”. Ao fixar uma única forma gráfica (TIO, por exemplo), a ortografia permite que, ao ler silenciosamente, possamos, de forma rápida, reconhecer igualmente a mesma palavra, com a vantagem de, ao lê-la em voz alta, termos a liberdade de continuar usando nossas distintas pronúncias (p.15-16).
Vimos que, do ponto de vista histórico (ou “diacrônico”), cada língua com notação alfabética só depois de algum tempo passou a ter uma norma ortográfica, a partir do qual se estabelecia um acordo social sobre as formas únicas autorizadas para escrever as palavras. Do ponto de vista do aprendizado individual, ocorre algo semelhante: primeiro, os aprendizes dominam as restrições ou propriedades do sistema de escrita alfabética e, só em seguida e aos poucos, vão internalizando a norma ortográfica.
Para alfabetizar-se, um indivíduo – criança, jovem ou adulto – precisa, inicialmente, compreender uma série de propriedades do sistema alfabético, para poder vir a usar as letras desse sistema com seus valores sonoros convencionais. Necessita, assim, compreender que o repertório de letras usadas para escrever sua língua é fixo, que não pode inventar letras e que só poderá usar as letras que, de fato, são utilizadas por quem já sabe ler e escrever. Necessita, ainda, compreender que o que a escrita alfabética nota ou representa são os segmentos sonoros das palavras (e não seus significados ou as características físicas dos objetos que elas nomeiam) e que, para registrar a pauta sonora das palavras, colocamos no papel mais letras que as sílabas que pronunciamos. Precisará, também, compreender quais são as combinações ou sequências de letras permitidas e as posições em que elas podem aparecer... além dos valores sonoros que podem assumir (P.16-17).
Entendemos que as propriedades do objeto “norma ortográfica” operam respeitando aquelas já definidas pelo objeto “sistema de escrita alfabética”. Assim, a partir das combinações de letras que este último permite e dos valores sonoros que as letras nele assumem, a norma ortográfica cria outras propriedades ou restrições. Às vezes, como veremos, elas são pautadas por regras. Noutros casos, a norma estabelece formas únicas autorizadas, que o usuário terá que memorizar, sem ter como se guiar por uma regra. Para concluir essa explicação, queremos esclarecer que concebemos o objeto “norma ortográfica” como o conjunto de convenções que fixa as formas sob as quais as palavras devem ser grafadas. Não usamos a expressão “normas ortográficas” como sinônimo de regras de ortografia, já que a norma em questão inclui tanto casos regulares como irregularidades. Tampouco falamos de “sistema ortográfico”, já que entendemos que a ortografia não constitui um sistema notacional, como o de escrita alfabética, mas, sim, uma “norma” que, respeitando as propriedades daquele, define quais os grafemas (letras ou dígrafos) devem ser usados (p.17).
1 - Quando analisamos as correspondências letra-som do português, é preciso tratarmos separadamente o que são “regras de leitura” e “regras de ortografia”, sobretudo se consideramos aprendizes principiantes. No português, como na maioria das línguas com escrita alfabética, existem muito mais regras sobre os valores sonoros que as letras podem assumir na leitura das palavras que regras que ajudem o usuário a escrever as mesmas palavras corretamente (p.20).
2 - Para “mapear” o que é regular e o que é irregular na ortografia de uma língua, é necessário ter como referência a pronúncia de determinado grupo sociocultural. Historicamente, por razões de ordem política e ideológica, foram as formas de pronúncia dos grupos dominantes, “mais letrados”, que serviram de base para definir o que é regular nas relações entre sons e grafias.

Desafios[1]:
ch ou x? chalé / xalé - mochila / moxila - relachar / relaxar – tachar / taxar 
g ou j?  gesto / jesto  - geito / jeito – magestade / majestade – tigela / tijela
c ou sc? adolecente / adolescente – penicilina / peniscilina – recensão / rescensão – recindir /rescindir
s ou x? esplêndido / explêndido – espontâneo / expontâneo – esímio / exímio – êsito / êxito

Principais dificuldades da ortografia em Língua Portuguesa:
1.       Um mesmo fonema representado por grafemas diferentes.
Fonema /s/: sei, assassino, crescer, cresço, cedo, cansaço, exceto, exsudar, auxílio, paz.
2.       O emprego das letras e e i representando o fonema /i/ e o emprego das letras o e u representando o fonema /u/ : cidade, privilégio, botão, jabuticaba.
3.       A grafia de certas palavras e locuções: enfim, a fim, embaixo, em cima, devagar, de repente.

Como evitar erros de ortografia:
1.       Conheça os aspectos de nossa grafia que oferecem dificuldades. Assim saberá quais são os pontos em que deverá ter cuidados especiais.
2.       As regras de acentuação e as poucas regras aqui citadas são as que você deve conhecer. Afora isso, saiba que a grafia correta das palavras é internalizada/memorizada mediante a leitura intensiva e inteligente.
3.       Pratique o exercício de dúvida. Duvide. "O ignorante não duvida porque desconhece que ignora" (Sócrates). Pergunte-se: será que é com 'ss' ou "ç" ? com "x" ou "ch"? com "h" inicial? com "j" ou com "g"? com hífen? etc. A dúvida é o ponto inicial da reflexão, do conhecimento.
4.       Use uma outra palavra ou torneio de linguagem para evitar a palavra cuja grafia oferece dúvida.


[1] Os desafios, bem como a lista de dificuldades e os conselhos para evitar erros de ortografia estão em SCARTON, Gilberto. Guia de produção textual: assim é que se escreve... Porto Alegre: PUCRS, FALE/GWEB/PROGRAD,
[2002]. Disponível em: < http://www.pucrs.br/gpt >. Acesso em: 2/12/2013.